A vida de Lauir Gonçalves Pereira, em Pérola, interior do Paraná, era de uma típica família de classe média. O pai era cafeicultor, a mãe dona de casa. Ao se casar, com apenas 16 anos, a adolescente mudou-se para Campo Mourão, onde passou a oferecer aulas de teclado e órgão. A facilidade com que lidava com a música, levou-a ao sexto ano do curso de piano e lhe proporcionou uma grande procura na cidade. Quando abriu a sua própria escola, mais de 70 alunos estavam matriculados. Ela mesma produzia as partituras, desenvolvia o material didático e criava até mesmo um jornal para divulgar os acontecimentos do ambiente escolar.
Gaivota, como sempre foi conhecida, não era rica, mas tinha uma vida confortável. Era proprietária de duas casas, tinha carro e uma empregada responsável pelos serviços domésticos e pelo preparo das refeições. As coisas mudaram, quando um exame de rotina detectou um adenoma na glândula hipófise e surgiu a dificuldade de obter tratamento pelo SUS, na rede de hospitais do Paraná. Nessa altura, o marido de Lauir havia se mudado para o Piauí, a trabalho, e ela soube que poderia ser mais fácil conseguir tratamento nos hospitais públicos de São Paulo. Ao vislumbrar tal oportunidade, a professora mudou-se com a filha para a capital paulista, com a promessa do marido de que bancaria o aluguel, água, luz e alimentação.
Mal chegou à cidade grande, Lauir descobriu, após o divórcio, que as coisas não eram como pensava e, acamada por sua enfermidade, não tinha condições de se locomover sozinha. Sua filha completava 16 anos e era quem a auxiliava nas tarefas mais simples. Para sobreviver, Danlary preparava chocolate e vendia nos bares. Nesse período, sua fi-lha matriculou-se no curso de jornalismo da Mackenzie e a vida melhorava aos poucos.
Se os planos não aconteceram como ela havia planejado, a casa caiu quando descobriu que o marido não estava enviando dinheiro para pagar o aluguel e elas foram despejadas. Lauir e sua filha, Danlary, dormiram alguns dias na rua, até que foram resgatadas por alguns membros de uma igreja evangélica que as receberam na garagem. Como elas se recusaram a participar dos cultos, já que eram de outra religião, foram expulsas do local e caminharam dois dias pelas ruas de São Paulo, até que fossem acolhidas por um dos “chefes” do Morro da Kibon que se solidarizou com a situação e lhes ofereceu um barraco de madeirite. A vida era tranquila na favela. Não havia roubos, a porta não tinha nem maçaneta e eram respeitadas pela comunidade. Apaixonada por animais, diversos moradores levavam cães feridos para que Lauir cuidasse e, depois de alguns meses, as moças dividiam o único cômodo do barraco com cerca de 14 deles.
Um ano e meio após se mudarem para a Kibon, o homem que as havia ajudado pediu o barraco de volta e, mãe e filha, caíram de novo nas ruas. Naquele dia, queimaram tudo o que não podiam carregar e partiram com poucos pertences para a noite escura de São Paulo, acompanhadas por quatro cães que serviam como guardiões. “Nenhuma pessoa chegava a cinco metros de nós, sem que eu deixasse. Eu dormia com a corrente da coleira enrolada no meu braço. Se alguém se aproximasse, os cães nos avisavam.” – relata Lauir.
Era dura a vida nas ruas. Alguns dias, elas dormiam em postos de gasolina. Em outros, ocupavam casas interditadas. No restante, sobreviviam nas calçadas e contavam com a boa vontade dos paulistanos. “Não passávamos fome. Sempre tinha alguém para ajudar. Um dia, um homem não re-parou que eu morava na rua e deu 25 quilos de ração para os cães. Eu nem tinha como carregar aquilo.” – conta Danlary.
Algo que causava grande preocupação nas moças era a higiene pessoal. Para evitar o acúmulo de sujeira e outros transtornos, Danlary abriu mão da vaidade e raspou os cabelos. Para se lavarem, a única opção era utilizar as pias de bares e restaurantes, onde faziam uma limpeza básica. Apesar de passarem por provações e sobreviverem da maneira mais precária possível, elas jamais perderam a dignidade.
A compra de um guia turístico sinalizou a saída de São Paulo em busca de um destino menos adverso. Enquanto Danlary dava preferência ao litoral, Lauir lembrou-se do quanto seu pai era caridoso e optou pelo local onde ele havia nascido: Minas Gerais. Para isso, precisariam caminhar pela Fernão Dias, até Mairiporã, onde conheceram um “trecheiro” (nome dado às pessoas que caminham de cidade em cidade) e que indicou uma tal “Santa Rita do Cupuaçu” como opção para trabalhar na “panha” do café. “Eu tinha intenção de trabalhar na roça, local onde poderíamos viver com os cães. A oportunidade que aquele homem nos mostrou, parecia ser a melhor.” – lembra Gaivota.
Perto de Pouso Alegre, um caminhoneiro perguntou se elas queriam alguma coisa e elas pediram para dormir no baú do caminhão. O homem procurou conhecer um pouco da história daquela família e soube que elas procuravam uma Santa Rita que não tinha no mapa. “Não seria Sapucaí?” – perguntou o homem. Lauir disse que o trecheiro poderia ter se enganado e ele contou que havia nascido por aqui. “Vamos comigo. Levo vocês até lá.”
Ao chegar a Santa Rita, no dia 17 de abril de 2009, Lauir e sua filha foram até a pracinha da Rua da Pedra e pediram um lanche ao Zé do Trailer. “Ganhamos três lanches. Um para cada uma e outro para os cães.” A mesma cordialidade não encontraram no albergue, já que a política era não aceitar mulheres. Seria preciso dormir em um palco montado na praça.
Enquanto dormiam no coreto, Lauir foi surpreendida, num dia frio, com a presença de um policial e de uma assistente social. “Venho da parte do meu superior pedir que vocês vão embora de Santa Rita. Ele mandou dizer que vocês não são bem-vindas aqui. O que a assistente social não contava era que Danlary era bem informada e respondeu no mesmo tom: “Não é porque estamos na rua que vocês estão lidando com pessoas ignorantes. Vivemos em um país democrático e temos o direito de ir e vir. Se vão nos prender, queremos saber qual é a acusação.”
Algumas pessoas que passavam pelo local perceberam o movimento e tomaram as dores das moças. Para resolver o problema, cederam suas casas por alguns dias, até que elas conseguissem moradia. “Enquanto minha filha dormia dentro das casas eu ficava com os cães do lado de fora. Eles tinham nos acompanhado até ali. Não poderia abandoná-los naquele momento.” – relata Lauir.
De abril até novembro, as moças tinham uma casa alugada através de mobilização popular e viviam de bicos. No final do ano, Danlary conseguiu o primeiro emprego na cidade, em uma videolocadora. Na mesma época, os Vicentinos ofereceram uma casa nas proximidades da Linear e tudo começou a dar certo. O pior passou.
Para levar sustento ao lar, Lauir tomou conta de uma senhora enferma por um ano e meio, trabalhou alguns meses na Fênix e vendeu doce de leite nas ruas, até aprender com os seus amigos – os moradores de rua – uma profissão que viria a desempenhar muito bem: a coleta e venda de materiais recicláveis. Atualmente, Gaivota pode ser vista na cidade com uma carrocinha onde carrega latinhas, garrafas pet, papelão e outros tipos de sucata. Com o dinheiro que arrecada, é possível pagar os exames de sua filha, grávida do segundo filho, e manter as contas em dia.
Sempre com um sorriso no rosto, ela sonha em conseguir um carrinho melhor para realizar seu trabalho e tem realizado os preparativos para a chegada do próximo neto. “Eu conto com a ajuda dos Vicentinos que me fornecem uma cesta básica e me mandam algumas frutas nos finais de semana. Minha filha retornou à faculdade, mas precisou abandoná-la porque não tivemos condições. É um sonho dela poder trabalhar no auxílio de pessoas carentes. Todas as semanas, vou à beira do rio e reencontro os amigos que ensinaram a minha profissão e com quem convivo até hoje. Para mim é uma honra tê-los conhecido e tenho orgulho da minha trajetória. Através das dificuldades, amadureci sem nunca perder a fé. Não tenho raiva, nem vergonha. Deus está sempre na frente da minha vida e acredito que muitas conquistas ainda estão por vir.” – finaliza Lauir.
auxi-liava?? Como uma agência de publicidade, não poderiam ter erros do tipo.
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Linda Historia de vida e tem pessoas que reclamam por muito pouco
Obs: erros de ortografia acontece , mais ninguem vem querer fazer a materia então não critiquem